Foto: Marcelo Casal / Agência Brasil
Decisão da 1ª Vara Cível da Comarca de Ibirité, em MG, proferida pela juíza Patrícia Froes Dayrell, declarou nulo contrato de cartão de crédito consignado que incidia sobre benefício assistencial (BPC-Loas) de titularidade de uma criança de 4 anos e condenou a instituição financeira responsável pelo empréstimo consignado a indenizar o menino, por danos morais, em R$ 10 mil. A sentença também determinou a cessação definitiva dos descontos e o cancelamento imediato do cartão de crédito.
A ação foi ajuizada pelo menino, representado pela mãe, que afirmou ter solicitado um empréstimo consignado a ser debitado do benefício que a criança recebe do INSS, visando suprir as necessidades dele. Contudo, ao perceber altos valores descontados do benefício, a responsável descobriu que os débitos se referiam a um cartão de crédito que não contratou. A mãe pediu, em caráter liminar, a imediata suspensão dos descontos, além de reparação por danos morais.
A juíza, ao analisar a petição inicial, concedeu o pedido liminar e determinou a imediata oitiva do Ministério Público de Minas Gerais. O órgão requereu a intimação das partes para apresentarem documentos que comprovassem que houve autorização judicial para celebração do negócio jurídico.
O banco sustentou que a contratação do empréstimo e cartão consignado era legítima, tendo sido confirmada pela cliente com o envio de selfies. Segundo a instituição financeira, depois do negócio, foram liberados valores em favor da criança, não havendo defeito na prestação de serviços nem ato ilícito de sua parte.
Apesar de intimados, nem a mãe nem o banco comprovaram a existência de prévia autorização judicial para a averbação do contrato em benefício da criança. O parecer do Ministério Público opinou pela declaração de nulidade dos contratos, porque as formalidades legais não foram observadas.
Fundamentos
A juíza Patrícia Froes Dayrell fundamentou a decisão na Lei nº 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, internalizada no Brasil por meio do Decreto nº 6.949/2009, e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), destacando a Teoria do Diálogo das Fontes como meio para se interpretar a extensão das normas consumeristas aos menores.
Segundo a magistrada, “mesmo que o consumidor atue com culpa ao procurar o banco para realizar o empréstimo em nome de terceiro incapaz, tal fato não exime o fornecedor, que também concorre para a concretização da contratação, de participar da mitigação do prejuízo, prevalecendo a boa-fé objetiva e evitando o agravamento do dano”.
A mãe não desejava o cartão de crédito, apenas o empréstimo consignado. Porém, como isso foi feito sem autorização judicial, o contrato não tinha validade. Sendo irregular a contratação, os valores descontados do benefício previdenciário deveriam ser devolvidos.
O entendimento foi de que a indenização por danos morais era devida, pois o banco se omitiu diante de instrução normativa editada pelo INSS e de determinação do Código Civil, exigindo autorização judicial para disposição de bens de menor. Assim, estipulou a quantia de R$ 10 mil, valor que, para ser levantado, deve ser submetido à prestação de contas futura e prévia oitiva do MP-MG.
Ao final, a juíza determinou a remessa dos autos ao Ministério Público Federal para que tome ciência da autorização de averbação de empréstimo em benefício previdenciário de menor, sem autorização judicial, pela instituição financeira e pelo INSS.