O papel da polícia cabe ao governo estadual,
mas há muitas outras funções que podem caber à prefeitura
As eleições acabam de acontecer e diversos
jornais noticiam como, para a maioria dos eleitores, a segurança pública passou
a ser uma de suas principais preocupações, superando temas que,
tradicionalmente, ocupavam esse lugar, tais como saúde, educação e pobreza. Mas
será mesmo que a prefeitura possui função na área de segurança pública?
Nos últimos tempos o município pacato que é
Macajuba, tem se tornado uma desordem, nas redes sociais há discussão sobre o
que pode ser feito por parte do prefeito Luciano de Noé(PSD), para tentar
amenizar a situação, esse texto publicado no site, Carta Capital, mostra com
clareza qual a responsabilidade da prefeitura em relação a Segurança Pública, o
texto foi escrito por quem intende do assunto, Ludmila Ribeiro, professora do
Departamento de Sociologia e Antropologia e pesquisadora do Centro de Estudos
de Criminalidade e Segurança Pública da Universidade Federal de Minas Gerais, é
associada do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Veja o artigo:
A Constituição Federal, em seu art. 144,
estabelece que “a segurança pública, dever do Estado, direito e
responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: polícia
federal; polícia rodoviária federal; polícia ferroviária federal; polícias
civis; polícias militares e corpos de bombeiros militares”. Ou seja, lendo
apenas a nossa constituição, ficamos com a impressão de que a segurança pública
é um problema de polícia. Então, isso equivale a dizer que apenas as polícias
possuem competência para lidar com os problemas do crime e da insegurança? Será
que os municípios nada podem fazer em termos de prevenção ao crime?
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Pública:
A resposta a essas perguntas é um sonoro não.
Inclusive, estudos recentes demonstram que as iniciativas capazes de viabilizar
uma redução duradoura tanto das taxas de crime e como do sentimento de
insegurança demandam, além de investimento nas/das polícias, envolvimento
direto do executivo estadual e municipal na execução das políticas de prevenção
e repressão ao crime. Então, com a proximidade das eleições municipais, cumpre
destacar qual é o papel que as prefeituras podem ter nessa área.
Para estruturar a sua intervenção na seara da
segurança pública, o município deve compreender qual é a dinâmica da
criminalidade na cidade, pois, apenas entendendo que fatores estão relacionados
ao crime, é que se torna possível pensar em que ações a serem executadas pela
prefeitura para diminuir a sua ocorrência. Quando o executivo municipal não
possui em seus quadros funcionários especializados para a execução de
atividades como essa, é comum ele recorrer à consultoria de algum centro de
pesquisa que, geralmente, realiza esse estudo sob encomenda. Minas Gerais,
Pernambuco, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul são estados que
possuem centros de pesquisa especializados na realização de estudos para as
prefeituras que desejam investir na seara da segurança pública.
Uma vez encerrado o diagnóstico, esse é utilizado
como base para a elaboração de um Plano Municipal de Segurança Pública, cujas
ações podem ser operacionalizadas por uma Secretaria Municipal de Segurança
Pública ou, até mesmo, por uma Coordenadoria de Ordem Pública. De maneira
geral, a criação de instâncias como essas tem como objetivo viabilizar o
planejamento, implementação, monitoramento e avaliação de ações, projetos e
programas que tenham como objetivo a prevenção do crime e a redução do
sentimento de insegurança no âmbito municipal.
No caso de pequenos municípios, que não dispõem de
orçamento suficiente para elaborar um diagnóstico e um plano de segurança
pública, que não possuem condições de constituir e manter a estrutura
administrativa de uma Secretaria/Coordenadoria Municipal de Segurança Pública,
a prefeitura também pode investir nessa seara. Uma forma de realizar tal
empreendimento é a partir da constituição de canais de comunicação entre a
população e as agências responsáveis pelo provimento da segurança pública que
atuam no nível local. Trata-se dos Conselhos Comunitários de Segurança Pública
(Consep´s), que permitem à população discutir os principais problemas que
causam insegurança no bairro ou na cidade. Esse canal é importante ainda por
viabilizar a troca de informações entre as polícias e os residentes na área
sobre a dinâmica do crime e da violência. Além disso, como as reuniões dessas
instâncias devem ser mensais, sendo sempre iniciadas por uma espécie de
prestação de contas dos desdobramentos da reunião anterior, à medida que as
organizações demonstram a sua capacidade em dar respostas aos problemas
apresentados pela população, é bem provável que a população aumente a sua
confiança no trabalho das polícias.
As prefeituras podem atuar também no sentido de
instituir instâncias que viabilizem o desenvolvimento de ações integradas de
prevenção e repressão ao crime. Trata-se dos Gabinetes de Gestão Integrada
(GGI). Com isso, as polícias, o judiciário, o Ministério Público, o sistema de
cumprimento de penas privativas de liberdade e medidas sócio-educativas podem,
em conjunto: (1) discutir a dinâmica da criminalidade; (2) distribuir a
responsabilidade de cada uma das organizações no gerenciamento do fenômeno, (3)
elaborando planos de ação integrados, que ao racionalizar os esforços,
maximizam os resultados. Por fim, o GGI permite que tais organizações (4)
avaliem os êxitos e os fracassos dos planos de ação executados, reformulando
estratégias e definindo novas intervenções.
A guarda municipal é outro exemplo de ação que o
município pode ter na seara da segurança pública. Apesar de ela ter a função de
proteção do patrimônio público, sua presença tende a evitar o cometimento de
crimes, por ser constituída de indivíduos uniformizados. E, pelo mesmo motivo,
aumentam a sensação de segurança do cidadão que passa pela via pública e se
sente protegido com a presença de tal profissional. Destaca-se também a
possibilidade de as guardas municipais fazerem uso das imagens geradas através
do sistema de vigilância eletrônica, orientando a sua ação tanto em termos de
prevenção de crimes quanto no que diz respeito à repressão de atos de
vandalismo e de violências nas escolas.
Por fim, mas não menos importante, a prefeitura
pode contribuir para o desenvolvimento de políticas de prevenção ao crime que
tenham como público alvo as crianças e os adolescentes. Neste ponto,
destacam-se as iniciativas que visam (1) o entendimento dos condicionantes da
violência nas escolas, para a elaboração de ações que visem a sua redução; (2)
a operacionalização de programas de profissionalização e lazer, que tenham como
objetivo ocupar os jovens no período extraclasse evitando, dessa forma, o seu
envolvimento com atividades ilícitas; (3) a manutenção e supervisão de programas
direcionados aos menores infratores que receberam medidas sócio-educativas de
liberdade assistida e de prestação de serviços à comunidade, de maneira a
diminuir a probabilidade de eles cometerem um novo crime quando do fim da
execução dessas medidas.
Essas são apenas algumas das iniciativas que o
município pode desenvolver na seara da segurança pública. Contudo, é
imprescindível que o executivo municipal tenha uma dimensão exata de como
iniciativas dessa natureza podem contribuir para a redução do crime, o aumento
da sensação de segurança e, por conseguinte, a melhoria da qualidade de vida na
localidade. Assim, cabe a cada um de nós cobrar do seu candidato a prefeito a
realização de medidas como as aqui expostas para que manchetes como “Brasil tem
um assassinato a cada 10 minutos, diz Ministério da Saúde” não sejam tão comuns
em nossos jornais.
Ludmila Ribeiro, professora do Departamento de
Sociologia e Antropologia e pesquisadora do Centro de Estudos de Criminalidade
e Segurança Pública da Universidade Federal de Minas Gerais, é associada do
Fórum Brasileiro de Segurança Pública
Fonte: Site Carta Capital.